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Texto curadoria

Benin, Brasil, Nigéria, Togo, Burkina Faso, Níger, Cuba, Haiti, Suriname, Senegal, Congo Belgo, Costa do Marfim, Guiné, Serra Leoa, Mali, Argélia, Mauritânia, Antilhas Francesas, Estados Unidos da América, Equador, Santo Domingo, Camarões. É imensa a lista de países e regiões fortemente ligados à cultura africana visitados por Pierre Verger.

Fotógrafo-viajante, que se tornou antropólogo não assumido, babalorixá não atuante, Verger desde o princípio foi atraído por muitas culturas no mundo, em especial pela africana, e sua Rolleiflex magnetizada pelo corpo negro. De suas ligações, na França dos anos 1930, com os integrantes do Musée de l’Homme, do movimento surrealista e das saídas ao Bal Negre na boêmia Rue Blomet, até o reconhecimento internacional, a atuação de Verger no mundo africano – ou de origem africano – aos poucos foi se consolidado ao longo do século 20.

Através da fotografia, Verger construiu, nos anos 1930, um novo testemunho acerca da dignidade do povo africano, até então colonizado, rebaixado, humilhado. Difícil afirmar até que ponto Verger levou à França uma nova visão do modo como viviam os africanos, por meio de suas fotografias publicadas na imprensa francesa nessa época. Com o passar dos anos, Verger tornou-se um mensageiro que soube recriar a preciosa ligação entre o povo do candomblé e seus descendentes iorubá, um século após o fim da escravidão.

Embora nascido em uma família europeia burguesa, Verger não se cansou de registrar o cotidiano de povos no Brasil e na África. Como quem mergulha em busca de um resgate ancestral, dedicou-se com afinco a uma cultura completamente distante de sua origem, cuja simplicidade cotidiana em contraponto com a riqueza imaterial o fascinava a ponto de fazê-lo se mudar de vez para o Brasil, especialmente para a Bahia. Em terras baianas, Verger adotou não apenas nova residência, mas um estilo de vida. Dos anos 1960 até sua morte em 1996, morou em uma casa simples, de cama estreita e poucos móveis. Escolheu um bairro popular, desenhado por vielas e saliente ladeira.

Precursor no mundo da antropologia visual, com a publicação do livro Dieux d’Afrique, nos anos 1950, Verger conseguiu o raro desafio de juntar em sua obra três vertentes geralmente antagonistas: o visual, o escrito e o oral*. Entretanto, nesta mostra, optamos por destacar apenas o aspeto visual de sua obra dedicada às temáticas africanas e afro-americanas. Uma tentativa de apresentar a notável qualidade plástica e poética do seu trabalho - características que o consagraram reconhecido fotógrafo internacional no século 20 -, e também de destacar a importância dessas imagens, precioso registro histórico de culturas pobres em testemunhos iconográficos no período abordado.

Suas fotografias nos convidam a uma viagem no tempo com destino às sutilezas e peculiaridades do mundo interpretado por Verger de 1932 até os anos 1970.  Inevitável absorver o fascínio que motivou Verger ao ver cenas do nosso passado, muitas vezes tão próximo de nossas atuais experiências. Um presente construído por uma visão simples e humana de um mundo transformado pelos olhos e pela Rolleiflex de um poeta do cotidiano. Assim seguimos o caminho desse homem branco que passou grande parte de sua vida a destacar com maestria a beleza, o valor e a importância de culturas de origens africanas.

(*) conferir o relevante livro “Do olhar livre ao conhecimento iniciático” recentemente publicado no Brasil pelo pesquisador Jérome Souty.